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Por Marcelo Albuquerque
Quando estudamos a paisagem na arte e a concepção de espaços arquitetônicos em desenhos artísticos e técnicos, nos deparamos com um conceito conhecido como perspectiva. Estudar a perspectiva é fundamental para compreendermos os vários estilos e épocas em que a paisagem foi concebida por artistas. Entretanto, a perspectiva não é só aplicada à paisagem, mas é um dos fundamentos do desenho em geral. Mas, então, o que é perspectiva?
PERSPECTIVA → “saber ver”

Um quadrado (polígono de quatro lados iguais) e um cubo (formado por seis faces quadradas). Marcelo Albuquerque, 2008.
A perspectiva corresponde a como o ser humano apreende visualmente seu ambiente e o transfere a outro suporte, seja aplicando a projetos técnicos ou artísticos. A perspectiva é o método que permite a representação de objetos tridimensionais (altura, largura e profundidade) em superfícies bidimensionais, através de determinadas regras geométricas de projeção, conforme a figura anterior.
A perspectiva não é somente usada na arte, mas também na arquitetura, engenharia e na computação, entre outras áreas. Artisticamente, podemos utilizar a perspectiva mais livremente, sem o rigor matemático exigido na arquitetura ou engenharia. Quando já entendemos com maior profundidade as questões básicas da perspectiva de forma rígida, podemos assim trabalhar mais intuitivamente, com a mão livre e sem ferramentas como réguas e esquadros. O nosso olhar já irá percorrer facilmente a paisagem e o entorno identificando os principais pontos de convergências e de profundidade.
Axonométricas (isométrica, dimétrica e trimétrica):
Segundo Ching, a axonometria é o desenho paraline de uma projeção axonométrica, em que todas as linhas paralelas aos três eixos principais são traçadas em escala, enquanto as linhas diagonais e curvas são distorcidas. As axonometrias ou perspectivas axonométricas se dividem em três categorias: isometria, dimetria ou trimetria.
A isometria é a situação onde os três eixos (xyz) estão separados por 120 graus. As faces principais estão inclinadas igualmente em direção ao quadro, de modo que seus três eixos principais são escorçados na mesma proporção.

Isométria. Fonte: Versus. Disponível em: http://www.versus.pt/forma-espaco-ordem/desenhotecnico-4-6-perspectivas.htm. Acesso em 22 jan. 2008.
A dimetria dá-se quando temos dois ângulos iguais e o terceiro aparece mais longo ou mais curto que os dois.

Dimetria. Fonte: Versus. http://www.versus.pt/forma-espaco-ordem/desenhotecnico-4-6-perspectivas.htm. Acesso em 22 jan. 2008.
A trimetria, por sua vez, dá-se quando as distâncias entre os eixos possuem ângulos distintos, ou seja, os trÊs eixos principais são escorçados em ângulos diferentes.

Trimetria. Fonte: Versus. http://www.versus.pt/forma-espaco-ordem/desenhotecnico-4-6-perspectivas.htm. Acesso em 22 jan. 2008.

Imagem do jogo SimCity: Utilização da axonometria na projeção da cidade. Fonte: http://simcity.ea.com/about/simcity4/screenshots.php. Acesso em 22 jan. 2008.
Gabinete, Cavaleira e Militar:
Projeção cilíndrica oblíqua, com uma das faces paralela ao plano de projeção. A projeção ortogonal de um círculo será uma elipse. Ainda, segundo esta classificação, podemos dizer tecnicamente que uma perspectiva cavaleira ou militar é uma perspectiva axonométrica dimétrica. Desta forma, quem via a perspectiva tinha a sensação de possuir uma visão de “olho-de-pássaro” sobre o terreno representado. Os termos cavaleira e militar foram cunhados porque eram perspectivas bastante utilizadas para projetar topografia de terreno em mapas destinados a fins de estratégia militar, quando se colocava a face paralela ao plano de quadro perpendicular ao plano do solo.

Perspectiva de Gabinete. Fonte: Versus. http://www.versus.pt/forma-espaco-ordem/desenhotecnico-4-6-perspectivas.htm. Acesso em 22 jan. 2008.
Perspectiva linear ou cônica (ponto de fuga)
1 ponto de fuga: Na perspectiva com 1 ponto de fuga, o artista representa um objeto ou uma paisagem tridimensional projetando-o sobre um plano a partir de um ponto – o ponto de fuga, que se encontra sobre a linha de horizonte imaginária. Todas as linhas de projeção do desenho convergem para esse ponto, que, apesar de poder não estar representado, tem uma relevante presença na estrutura da obra. Os elementos mais distantes do olho são os que se encontram mais próximos do eixo de visão. Portanto, Ponto de Fuga é um ponto imaginário de onde as linhas de fuga se originam e se afastam em direção aos planos mais próximos do observador.


Linha do horizonte, ponto de fuga e linhas de fuga. Marcelo Albuquerque, 2008.
Linhas de fuga: São as linhas imaginárias que descrevem o efeito da perspectiva convergindo para o ponto de fuga (linhas convergentes pontilhadas da figura acima). É o afunilamento dessas linhas em direção ao ponto que geram a sensação visual de profundidade das faces em escorço dos objetos em perspectiva.
Linha do Horizonte: A linha do horizonte sempre se apresenta na altura do seus olhos. É por ela que o ponto de fuga corre. Abaixado, sentado ou em pé, a LH sempre permenecerá na altura dos olhos. Quando a LH não for tão visível, ao contrário da linha que separa o céu do mar, para facilitar sua identificação, coloque um lápis na posição horizontal em frente ao seus olhos, mantendo o pescoço ereto sem levantar nem abaixar a cabeça.
Todas as linhas paralelas entre si e que se afastam em direção ao horizonte apresentarão este “ponto de fuga” sobre o horizonte, e todos estes pontos poderão ser representados no Plano de Quadro.

O ponto de fuga também pode ficar fora do Plano de Quadro. Linha do Horizonte sempre na altura dos olhos. Marcelo Albuquerque, 2008.

O ponto de fuga sempre corre pela linha de horizonte, nunca fora dela, quando utilizamos 1 ponto de fuga. Marcelo Albuquerque, 2008.

Leonardo da Vinci, na Santa Ceia, utilizou a perspectiva linear para compor este afresco. Note que o ponto de fuga esta na cabeça de Jesus, valorizando sua figura como ponto de convergência de todas as linhas. Adaptado por Marcelo Albuquerque, 2008.


Os planos paralelos ao observador (Plano de Quadro) sempre permanecem parelos à linha do horizonte, enquanto os planos que seguem para o horizonte respeitam a angulação das linhas de fuga.Marcelo Albuquerque, 2008.

Masaccio: Trindade. Santa Maria Novella, Florença. Fonte: Wikipédia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Masaccio. Acesso em: 27 mar. 2017. Adaptado por Marcelo Albuquerque.
Masaccio (1401 – 1428), foi um pintor do início do Renascimento italiano em Florença, trabalhando ao lado de nomes como Brunelleschi e Donatello, sendo um dos responsáveis pelo rompimento gradual com o estilo gótico internacional, cujos antecessores remontam à Giotto. Dentre suas grandes obras, para esse momento, destaca-se o afresco da Trindade, em Santa Maria Novella, em Florença, realizada por volta de 1427. Trata-se de uma representação em perspectiva ilusionista de uma capela lateral, pintada em afresco na nave lateral esquerda da igreja.
O afresco representa a cena da crucificação de Cristo, dentro de uma abóbada de berço com caixotões em perspectiva, cuja inspiração foi baseada nos arcos de triunfo da Roma Antiga, causando a sensação de profundidade. As linhas de fuga dirigem o olhar sobre a figura de Cristo na Cruz, sustentada por Deus Pai e para a pomba do Espírito Santo em voo, entre os dois. Abaixo, na representação de um altar de mármore, estão as figuras da Virgem Maria e São João. Mais abaixo, estão os dois patrocinadores do afresco, provavelmente da família Lenzi, ajoelhados diante da cena sagrada, nas mesmas dimensões das figuras sagradas. Por fim, abaixo dos patrocinadores, encontra-se um esqueleto deitado com a inscrição em latim, traduzido como “Eu já fui o que você é, e isso é o que você será”, recordando a transitoriedade da vida terrena (memento mori).

Relacionando a perspectiva com o Renascimento, a obra é um tributo à racionalidade, com sua simetria e ordem austera. As duas figuras ajoelhadas orando, dos dois patrocinadores, formam a base de um triângulo que se fecha no topo da composição. Outros triângulos podem ser traçados a partir das cabeças dos personagens de Jesus, Maria e João. O ponto de fuga da composição localiza-se nos pés da Cruz de Cristo, sendo o ponto de vista do espectador, colocando-o como um participante da cena.




História: os antigos povos gregos já possuíam alguma noção do fenômeno perspéctivo, denominando-o como “escorço”, onde encontramos esforços de aproximação à problemática da representação do tridimensional no bidimensional. Entre todos os povos cujas manifestações artísticas podem ser consideradas pré-perspécticas, os gregos (e os romanos, em evolução à arte grega) são aqueles que mais próximo chegaram da perspectiva: em suas pinturas eles adotavam um método conhecido como escorço (que poderia ser definido como uma falsa perspectiva), ou perspectiva espinha-de-peixe. Os gregos não conheciam o ponto de fuga, mas o escorço produzia resultados próximos do da perspectiva e com razoável ilusão de profundidade. Na Roma antiga, podemos ver no Quarto Estilo de pintura os exemplos mais belos de perspectivas romanas da Antiguidade Clássica.

Foi durante o período do Renascimento que a perspectiva foi descrita. Filipio Brunelleschi foi um dos célebres arquitetos da Renascença que se dedicou aos estudos matemáticos da perspectiva linear, ao lado do contemporâneo artista Masaccio. Brunelleschi desenvolveu os seus estudos sobre a perspectiva com o objetivo de aplicação aos planos arquitetônicos. Leon Battista Alberti, teórico e profissional da arquitetura, pintura e escultura, é mais conhecido pela sua obra arquitetônica, contudo é frequentemente considerado como o autor das primeiras formulações sobre as leis da perspectiva.
Para estes artistas e arquitetos renascentistas, a perspectiva é harmonia, o produto de uma racionalidade superior e divina que confirma o acordo perfeito entre o homem e a natureza. Esta característica passou a se tornar recorrente na arte do Quatrocento: não apenas a perspectiva tornava-se uma maneira de demonstrar profundidade como também ela passou a ser um novo método compositivo. As pinturas passaram a apresentar uma cena única, coerente, ao invés de uma combinação de situações diversas.
2 pontos de fuga: Fazendo uso da perspectiva conseguimos criar sensações de profundidade e volume em um desenho. Porém poderíamos aumentar essa noção de profundidade e maior visão de outros lados. Para isso, adicionamos mais pontos de fuga: agora, os dois planos dos objetos vísíveis seguirão os planos das linhas de fuga, respeitando as suas respectivas angulações. Note que agora, desta posição, somente as linhas verticais mantem-se como tais e paralelas entre si. O resto foge em direção ao horizonte formando duas séries de linhas em profundidade e reunindo-se cada série em seu ponto.


3 pontos de fuga: Na perspectiva com três pontos de fuga, existem três conjuntos de linhas de fuga e três pontos de fuga. Nem as verticais nem as horizontais se mantêm paralelas. Todas as linhas seguem ordenadamente para os seus respectivos pontos de fuga. Como vimos antes, dois destes pontos de fuga se mantêm na linha do horizonte, porém o terceiro e necessário ponto de fuga sai dessa norma, ocupando um lugar acima ou abaixo da LH.

Perspectiva aérea ou atmosférica:
A perspectiva atmosférica joga com variações de luz e cor. De forma a obter-se uma ilusão de profundidade, o artista emprega cores mais luminosas, contornos mais nítidos e textura mais espessa nos objetos mais próximos, sendo os mais afastados – que na tela são colocados mais acima – pintados com menos nitidez e normalmente com cores semelhantes às aplicadas no fundo. Isto porque a atmosfera terrestre, que contém poeira e umidade, se interpõe e afeta a luminosidade dos objetos.
Leonardo da Vinci construiu seu entendimento da perspectiva não apenas através da rígida formulação da perspectiva linear, mas também compreendendo a perspectiva levando em consideração o ar (ou a atmosfera) presente entre o observador e o objeto observado. Ele acreditava que não apenas o tamanho, mas também a aparência dos objetos mudava à medida que a distância entre objeto e observador aumentava. Da mesma forma, as linhas que delimitam a silhueta do objeto passariam a se tornar menos distintas com aquela distância. Estes dois elementos (atmosfera e bordas dos objetos) tornaram-se fundamentais na construção de sua perspectiva. Tal forma de entender a perspectiva veio, inclusive, a ser conhecida como perspectiva atmosférica. O pintor inglês Willian Turner foi um dos grandes adeptos da perspectiva atmosférica, onde explorou com muita intensidade os efeitos luminosos na pintura.

Na Monalisa, Leonardo da Vinci afasta as montanhas em último plano através da perspectiva atmosférica, criando um efeito esfumaçado suprimindo os detalhes ao fundo e realçando-os no primeiro plano. Em uma das diversas interpretações do quadro, as montanhas representam o mundo medieval encoberto por misticismo e ignorância em contraposição à figura da mulher, representada em seus mínimos detalhes e iluminada pela racionalidade renascentista. O homem renascentista tinha a consciência de seu lugar no tempo e espaço.
Leonardo da Vinci: Monalisa, ou La Gioconda. 1503. Museu do Louvre, Paris. Foto: Marcelo Albuquerque, 2019.
A perspectiva hierárquica é uma representação bidimensional. O desenho do espaço é mais simbólico que sensível e as figuras como acontecia entre os egípcios, obedecem à chamada convenção da perspectiva hierárquica: as figuras mais importantes são representadas em tamanho maior. Assim, no grupo, a disposição e tamanho das figuras é proporcional à importância de cada uma. Os exemplos mais importantes são encontrados na arte egípcia e bizantina. Outra forma seria por planos, ou seja, o que está mais próximo do observador ocuparia as partes inferiores do plano, enquanto as mais distantes ficariam acima, nas partes superiores.

Durante o período medieval, não só a técnica representativa da perspectiva se perdeu, mas também a visão de mundo dos indivíduos alterou-se, de forma que grande parte do conhecimento teórico a respeito do assunto se perdeu. O interesse em representar o mundo espiritual, e não o natural, levou os artistas a utilizarem a perspectiva hierárquica. Antes do surgimento da perspectiva linear renascentista, as pinturas e desenhos normalmente utilizavam uma escala para objetos e personagens de acordo com seu valor espiritual ou temático: em uma pintura egípcia, por exemplo, o faraó certamente era representado em tamanho várias vezes maior que o de seus súditos. Especialmente na arte medieval, a arte era entendida como um conjunto de símbolos (paisagem de símbolos), mais do que como um conjunto coerente. O único método utilizado para se representar a distância entre objetos era pela sobreposição de personagens. Os jardins, tema recorrente na arte medieval, representavam um refúgio organizado por mãos humanas através da intervenção divina. O mundo natural ainda é perturbador, mas o homem já pode criar um universo fechado e tranquilo. O poeta florentino Petrarca é o primeiro artista a se libertar do “jardim” e gozar a vida campestre fora dos muros das cidades como fonte de felicidade e poesia, fazendo anotações e poemas sobre a natureza, mas ainda com uma certa culpa medieval “por admirar coisas terrenas” (CLARK, p.25).
Bem legal Marcelo!
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Obrigado Marcelo. Excelente trabalho!
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Muito bom. Rico material para ser apresentado em sala de aula com os devidos créditos!
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MUITO BOM. ESCLARECEDOR.
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Excelente, ótimo conteúdo.
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Ótimo trabalho. Parabéns!
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Excelente! Me ajudou a entender e me ajudará a ensinar!
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PERFEITO!
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a dorrei e muito Bom alen de ser enformativo
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