Roma – introdução

Por Marcelo Albuquerque

Somos herdeiros diretos da civilização romana. Estudar Roma é estudar a nós mesmos. Muitas tradições artísticas e arquitetônicas se originam dos romanos, persistindo durante a Idade Média e desabrochando no Renascimento.  O cristianismo, as artes e o direito romano são os exemplos mais duradouros das influencias romanas no nosso cotidiano. A política romana nos legou diversas instituições e conceitos, junto aos gregos, como o senado, a república, a ditadura, o plebiscito, o magistrado, a tribuna, o consulado, entre outros. As línguas latinas, como espanhol, francês, italiano, português e romeno são herdeiras diretas da língua latina. Nossos nomes próprios também são: Augusto, César, Marco Antônio, Júlio, Marcelo, Márcio, Túlio, enfim, uma infinidade de nomes próprios são romanos.

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Peter Ellenshaw foi o responsável pelo Matte Painting do filme Spartacus, de Stanley Kubrick. Fonte: Film School Rejects. Disponível em: https://filmschoolrejects.com/watch-brush-with-greatness-peter-ellenshaws-matte-painting-for-spartacus-30fefc410fd4#.au3xsp13k. Acesso em: 25 jan. 2017.

Quando pensamos em Roma, logo nos recordamos das grandes produções cinematográficas de Hollywwood, como Spartacus e Gladiador. Os magníficos cenários da antiga cidade de Roma, como do filme Spartacus, de Stanley Kubrick, foram criados com uma técnica de efeitos especiais chamada Matte Painting, que mesclava pinturas artísticas com cenários e atores reais[1]. Entre os filmes que apresentam reconstituições arquitetônicas fiéis destaca-se A Queda do Império Romano, dirigido por Anthony Mann, em 1964, em especial a reconstituição fiel do Fórum de Roma. Na imagem do frame a seguir, vemos os personagens diante da cúria romana, na extrema esquerda, a basílica Emília, à esquerda, o templo de Divino Júlio César, no centro, e a basílica Julia, à direita.

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Frame de A Queda do Império Romano, de 1964. Fonte: Raices de Europa. Disponível em: http://www.raicesdeeuropa.com/wp-content/uploads/ca%C3%ADda-imperio-romano.jpg. Acesso em: 25 jan. 2017.

Outras memoráveis grandes produções, que nos apresentam uma monumental fantasia sobre a grandiosidade da arquitetura romana, é Quo Vadis e Ben Hun, clássicos de 1951 e 1959, respectivamente.

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Desfile militar em Roma, do filme Ben Hur. Fonte: Alpha Image. Disponível em: http://alfa-img.com/show/making-of-ben-hur-film.html. Acesso em: 25 jan. 2017.

Roma foi a civilização que surgiu como uma pequena aldeia e que se tornou o maior império ocidental da Antiguidade, consolidando a cultura clássica que formará as bases da civilização do Ocidente e abrirá caminho para a formação de toda a estrutura medieval, moderna e contemporânea. O mapa a seguir mostra o império próximo de sua máxima extensão, durante o império de Trajano, em 117 d.C.

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Mapa do Império Romano em 117. Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Muralha_de_Adriano. Acesso em: 25 jan. 2017.

A arquitetura e as artes romanas constituem uma ampla fusão entre a alta cultura grega (filosofia, artes e arquitetura, em especial), a cultura e tecnologia etrusca, civilização nativa e poderosa, porém misteriosa, que dominou a península itálica antes da ascensão dos romanos pelo Mediterrâneo, além das influências ditas bárbaras e orientais. O mapa a seguir apresenta o território etrusco, situado entre os rios Arno e Tibre, onde podemos ver Roma no extremo sul do território etrusco, na altura média da “bota” da península itálica.

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Mapa da Etrúria.  Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Etr%C3%BAria. Acesso em: 12 set. 2016.

Para compreender Roma, é necessário conhecer a civilização Etrusca, que legou aos romanos diversos conhecimentos e influências artísticas, arquitetônicas, religiosas e culturais. Pouco se conhece sobre essa cultura misteriosa, se compararmos aos gregos e romanos. O que se conhece dos etruscos na literatura são textos provenientes dos romanos e dos gregos, nem sempre amistosos em relação aos povos da Etrúria. Os próprios etruscos também foram muito influenciados pelas artes gregas, como se vê nas cerâmicas e pinturas tumulares no território etrusco, evidenciando um rico comércio entre as culturas do norte da Itália com a Magna Grécia. Roma alarga sua ligação com a cultura grega, adotando a estética clássica e helenística de forma ideal e formal, principalmente após a conquista da Grécia no tempo do cônsul Lúcio Múmio Acaico, em 146 a.C.

Sarcófago etrusco de Cerveteri, 520 a.C., Museu Nacional de Villa Giulia, Roma. Foto: Marcelo Albuquerque, 2015.

Fórum Romano

Fórum Romano. Foto: Marcelo Albuquerque, 2015.

Progressivamente, Roma desenvolve uma linguagem própria nas artes e arquitetura, além de um desenvolvimento sem precedentes na engenharia e nas construções monumentais. Os elementos que formarão a monumental arquitetura romana são, basicamente, o arco romano, a abóbada e o concreto pozolana, que veremos mais detalhadamente adiante. Essa linguagem romana se evidencia na monumentalidade. A celebração das conquistas militares é uma ferramenta poderosa de propaganda, admiração, espanto e temor. Roma acredita ser o centro do mundo desenvolvido, encarregada do dever de ordenar e civilizar o mundo conhecido.

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Fachada eclética neoclássica do CCBB em Belo Horizonte, com elementos clássicos. Foto: Marcelo Albuquerque, 2016.

Basta observar a arquitetura neoclássica e eclética nas grandes cidades que veremos os elementos greco-romanos nas fachadas dos edifícios. Frontões, capitéis, entablamentos, embasamentos, ornamentações em estuque com motivos clássicos, variados estilos de pintura romanos e estêncil são adotados até os nossos dias. As funções e plantas de edifícios públicos e residenciais também são heranças romanas. As igrejas tradicionais apresentam plantas basilicais, como veremos mais adiante, e sofreram poucas alterações ao longo de dois mil milênios. A arquitetura contemporânea pós-moderna se utiliza da linguagem clássica de forma livre.

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As sete colinas de Roma. Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Sete_colinas_de_Roma. Acesso em: 12 set. 2016.

Roma passa por três períodos bem definidos: a Monarquia, a República e o Império. A monarquia compreende o período de formação da cidade e sua conquista pelos etruscos. A cidade se forma a partir das sete colinas: Palatino, Capitolino, Esquilino, Quirinal, Viminal, Celio e Aventino. O fórum sofreu diversas ampliações ao longo da história, situando-se entre o Coliseu e o monumento a Vitorio Emanuel.

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Fórum Romano. Fonte: Wikipedia. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/F%C3%B3rum_Romano. Acesso em: 12 set. 2016.

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Fórum Romano. Fonte: Google Earth. Acesso em: 12 set. 2016.

Nos primórdios de Roma, a arte e arquitetura etruscas tem maior importância e influência. O primeiro templo de Jupiter Optimus Maximus e o primeiro grande sistema de esgotos de Roma, a Cloca Maxima, são obras etruscas e apresentam a sofisticação dos toscanos nas artes. Os últimos reis de Roma são etruscos: Tarquínio Prisco, Sérvio Tulio e Tarquínio, o Soberbo, compreendendo os anos de c. 616 a.C. até a expulsão dos etruscos, em 509 a.C. Alguns nomes de senadores romanos tinham nomes etruscos, o que significa que parte da aristocracia etrusca foi incorporada aos romanos.

A República romana, que vai de 509 a 27 a.C., inicia o período de independência dos etruscos e concretiza instituições e tipologias arquitetônicas que ainda estão presentes e influenciam o mundo contemporâneo. Roma, no século III a.C., destruiu e fagocitou a cultura etrusca, mantendo alguns túmulos. A conquista completa vem em c. 200 a.C. Roma se expande na península itálica, conquistando os etruscos e gregos. As Guerras Púnicas (264-146 a.C.), contra Cartago, cidade de origem fenícia, definem a supremacia de Roma sobre o Mediterrâneo. O conflito introduziu aos romanos o combate no mar. Amílcar Barca, general cartaginês, ocupa a Spania (atual Espanha), invade a Itália pelos Alpes e derrota 100 mil romanos, mas não invade Roma. Roma conquista a Sicília, a Córsega e a Sardenha. O quadro se reverteu com a decisão romana de atacar Cartago. Aníbal viu-se então obrigado a recuar para defender sua cidade e acabou derrotado na Batalha de Zama. Roma assume o controle da península Ibérica e, por fim, Cipião Emiliano Africano ataca e destrói completamente a cidade de Cartago, escravizando os sobreviventes. A cidade foi incendiada e suas terras cobertas com sal para que nada mais produzissem. Quando Roma domina a Grécia, em 146 a.C., ocorre uma maior e mais abrangente helenização das artes romanas, para onde convergem grandes artistas e arquitetos.

O Império, que inicia em 27 a.C., é o período mais conhecido e famoso, o mais retratado pelo cinema internacional. As realizações, conquistas, ímpeto e crueldade de seus imperadores marcarão a identidade dessa civilização, despertando, nos dias de hoje, interesse e paixão pelos estudos clássicos nas novas gerações. A queda do império no Ocidente é datada por convenção em 476[2], iniciando a Idade Média, porém o império continua existindo no Oriente, conforme veremos com mais profundidade mais adiante. O Império do Oriente será conhecido como Império Bizantino.

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Panteão, Roma. Foto: Marcelo Albuquerque, 2015.

[1] https://www.youtube.com/watch?v=94JL3Z0XqWk

[2] A data mais difundida da queda do Império Romano do Ocidente e início da Idade Média é 476 d.C., definida por Edward Gibbon (1737-1794). Para Henri Pirenne (1862-1935), foi com a invasão dos muçulmanos no séc. VII. Nos séculos VI, VII e VIII ocorreu a primeira Idade Média, com a fusão dos romanos com bárbaros, mantendo-se as mesmas estruturas romanas. Nos séculos XI e XII ocorreu o Feudalismo ou Sistema senhorial, além da Unificação cristã da Europa. O Império Bizantino, que é o Império Romano do Oriente, se estendeu até 1453 (Gibbon). Existem diferentes Idades Médias de acordo com o lugar. A mais popular é a estrutura medieval francesa. Os séculos XII e XIII se definem como a era das catedrais e do renascimento urbano; é a imagem medieval mais popular, com mais registros e fontes primárias.

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Publicado por

Marcelo Albuquerque

Pintor, desenhista, professor e escritor. Professor assistente da UC Expressão Visual, UC Estudos Críticos: história, arte e cultura, História da Arte, Arquitetura e Urbanismo, Teoria e História do Design, Desenho de Observação, Plástica e Patrimônio Cultural no Centro Universitário UNA, na graduação de Arquitetura e Urbanismo, Design Gráfico, Design de Moda e no curso tecnólogo de Design de Interiores. Mestre em Artes Visuais pela Escola de Belas Artes - UFMG. Especialista em História da Arte pela PUC MG. Especialista em Ensino e Aprendizagem na Educação Superior. Bacharel em Pintura pela Escola de Belas Artes - UFMG. Possui em seu currículo mais de 40 exposições artísticas e 3 livros publicados. É autor do website Arte e Cultura, disponível em: arteculturas.com e do website, disponível em: artealbuquerque.com.

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